segunda-feira, agosto 30, 2010

Redescoberta


Enquanto o olhar insistia em ver contornos
no escuro
e os momentos pesavam como gotas
sobre um lago na chuva
o avião passou
e dividiu a noite.

Enquanto o sono fugia
redescobriu o tempo
e a novidade antiga
além dos muros.

Mais longe
de onde os momentos vinham
o avião chegava a uma terra estranha
que ele bem conhecia.





sábado, agosto 28, 2010

Seis roteiros para o sertão




O sertão não fica à beira-mar, mas bem que poderia.

Qualquer de nós que chegue a seus limites terá razão de procurar o mar.
Debruçar num cais é um modo de chorar.

Toda miragem chega de graça aos portos mais distantes e aos corpos musicados de cenários.

Toda visão navegante se engana nos espelhos por onde as luzes passam.

As terras mais antigas e as mais secas são roteiros frustrados.

Assim tamém as pessoas do sertão, quando imaginam o dorso do mar.

*** 

Queridos amigos,
obrigada pelos votos e pelos comentários. 
Bom demais esse carinho.

terça-feira, agosto 17, 2010

Ler é uma delícia, mas L.E.R. é muito chato


Agora escrevo assim : D

(Tela de Caravaggio)

Tenho tentado contornar o problema, mas não há jeito. As DORT – Doenças Osteomusculares Relacionadas ao Trabalho, L.E.R. para os íntimos, são persistentes e muito incômodas, obrigam a gente a parar durante um bom tempo, até que os sintomas desapareçam e nos deixem em paz e em forma de novo.

O que pega é que o computador passou a ser pau para toda obra. Criar textos, construir ou consultar planilhas, ler, visitar sites, pesquisar, enfim, qualquer atividade depende dele. E como o trabalho “sério” – leia-se remunerado – é sempre preferência nesses casos, não há outro jeito senão reduzir as atividades diante a telinha, dar folga aos dedos e descansar os olhos também.

Apesar das férias recentes, não me afastei do teclado. Havia outras atividades para pôr em dia, e embora suprimindo boa parte das postagens e comentários, o L.E.R. continuou galopante. Pediu tempo, e disse secamente punto e basta, com cara de Totó, o italiano da novela.

Espero que não demore muito. Vou sentir falta dessas conversas virtuais, das trocas, do carinho desses amigos e de seus textos, poemas e comentários que me dão tanta alegria.
Agradeço por eles, de todo coração.

Beijo para todos. E até qualquer dia.

Dade

sábado, agosto 14, 2010

Poema amigo: Susana Miguel



há dias em que sou o alimento e o sumo doce da uva,
em que sei a largura dos ossos e a flexibilidade do arco.
às vezes, confundo a sombra dos objectos, a paisagem e os espelhos.
depois tento escrever sobre o pó e os símbolos que conheço e que não conheço.
há caligrafias internas e isso o que é (pergunto) e a noite e a metáfora e eu
apenas sei de vidros, da espuma nos talheres de que já te falei em 2007
e pouco mais. há dias em que respiro muito pouco, sabes.
é apenas o músculo que separa o tempo
e entre as coisas está, às vezes, a alegria de tudo.


                                                                                                                         Susana Miguel
                                                                                                                         13jun2010





Mesmo assim

Há um pássaro invisível
– sei dele como de mim
que me visita alguns dias
canta canções profanas
e desconhece limites.

Por ele
às vezes uma lembrança
volta a ser desejo
repete melodias
e dança
mesmo sabendo
do que passou
sem volta.
 
 
dade amorim
      11jul2010





quinta-feira, agosto 12, 2010

Manhã no jardim



E cada gota de orvalho
cada botão de jasmim
falam calados
sua linguagem vegetal
que não se pode entender
e entanto vive
– a fala muda da indiferença
enfeite bruto na vida paralela
e nova
cada manhã.

Nem sabem
o que é inveja.
Nem sabem dar as mãos
verdes de sol.

Serão felizes, as plantas?