sábado, setembro 28, 2013

De gavetas e gaiolas




A gaveta esquecida
retém lances de dados
jogos refeitos
e devaneios datados
de alguma primavera.

O corpo é um limite
e adivinha
mares e voos
preso à monotonia
da respiração necessária.

Respira na gaveta
uma existência de pássaro.
Aberta uma gaiola
o pássaro tem medo
de se atirar no vazio.


domingo, setembro 22, 2013

Constelações de Outono




Nas imagens da janela
ventos frios
e ecos avulsos
de vozes inseguras.
Presenças apressadas e distantes
pelas calçadas
cenários desenhados
para a muda constelação das outras vidas
no cosmos dos condomínios.

segunda-feira, setembro 16, 2013

Formas



Sem fim
te faço caber
no escuro precipício
tua amada.

Teu corpo
um potro o habita
e me consome em formas
convocadas.

Acordo antes de teu rastro
à luz de um astro rude que te ateia
madrugada
dança de duras flores
nossa festa
desabrochada.

sábado, setembro 14, 2013

Viver




Viver
é discutir o indiscutível
inadequado e lírico
inexata exatidão
rajada de impossível.

É se entrevar
manipular estorvos
e conquistar montanhas
passo a passo
topeçar
e do tropeço refazer o espaço.

Viver é se afogar
e em fogo renascer
no berço brando do amor
e desse amor
tantas vezes morrer
quantas for dado.

terça-feira, setembro 10, 2013

Domésticas




I
A roupa no varal entrega ao vento
a desbragada candura dos botões
e há uma canção de luz em andamento.

II
Além da mesa do almoço
o gato apaziguado nos espia.
Na tarde mansamente inaugurada
reaparecem as flores do futuro
: dentro de nós o vento se anuncia.

III
O vento na janela subverte
o quarto de dormir nesse
bailado insurreto de cortinas.
Nos muros do jardim
as vozes breves
em contraponto de intenções minúsculas
pensa por nós o vento
e imprecatada
a lava fria da lua nos contempla.
Varrido o chão da noite
o tempo recrudesce em nossa cama.

IV
O pássaro no mundo
de suas grades
é ele mesmo quadrado diminuto
afeito ao voo curto
e rumo ao céu
desfere a fantasia de seu canto.

sábado, setembro 07, 2013

Tradução




                                                          Desenho de Betti Timm


Presa entre os dentes
a palavra espera
desespera
e inarticulada se traduz
uivo ou lamento.