sábado, maio 23, 2009

Cinema

Há muito tempo alguém
nesses lagares
pisou as uvas verdes
de uma colheita violenta.
Alguma coisa se abriu maior que a tarde
ainda mais longa que a via férrea e suas cancelas
pontes que cruzam o mar em certas terras.

O homem calado hoje chegou mais cedo
desassossego
dos pensamentos no café do rio
e junto com o cigarro se acenderam
as primeiras lâmpadas
quando as estrelas eram ainda
faturas descartadas.

Nem sempre
os rumos cedem às horas combinadas
e nem é puro acaso se perder
por uma trilha apagada cor da tarde.

Há salvação às vezes
(sem brilho
com cicatriz)
porque a demora desfaz todo contorno
e as coisas se descolorem cinza chumbo
se o filme é preto e branco.

3 comentários:

nydia bonetti disse...

nem sempre
os rumos cedem às horas combinadas
e nem é puro acaso se perder
por uma trilha apagada à cor da tarde...
Que versos lindos, Adelaide.
Beijo

Guto Oliveira disse...

A vida imita a arte, Adelaide. E os filmes em preto e branco são ainda mais vida. adorei as imagens do poema (o homem calado hoje chegou mais cedo...). Adoro estar aqui e me embriagar em versos. Boa semana pra você. Beijo.

Beta disse...

Já disse que seus poemas são visuais (dessa vez, mais que clara a referência à arte de se representar por imagens, a começar pelo título escolhido), e sobre sua admirável capacidade de conjugar leveza e transbordamento em cada verso. Amei esse poema, sobretudo as duas últimas estrofes. :)