Este é um poema de domingo, com toda certeza.
De autoria de Marcelo Novaes, caro amigo de um talento excepcional.
Obrigada, Marcelo, e sempre muito sucesso!
Do amigo Marcelo Novaes
para a querida Dade Amorim.
(com um toquinho
cheio de beijos
meus (imagens)
para ambos)
Hora da visita: oito horas.
Você quer olhar tua vida com
meus olhos, drenar o Sangue da
Quimera e de todos os Monstros,
esvaziar-se daquele impulso.
O que há, no fundo, é drenagem
e não mudança de curso.
[Secagem a Frio].
Precisas falar com meus quatro
eus, nas oito horas do dia, nas oito
celas de cada hora do dia, pautadas
por meus olhos. Tirar o dedo da boca,
recolher a bituca do assoalho.
Recortar as falas dos filósofos [apenas
um punhado], enquanto te digo as coisas
que passsaram. As tuas coisas.
Tua saga cercada por livros, tantas falas:
a Calma e a Chama indissociavelmente
Juntas. Ausente a alegria de esperar por
filhos. Outra alegria a tua: Confeccionar
Alturas de Escadas a Cada Dia, deixadas
à Sombra, na Planura.
[Silenciar ao término do Fio].
Horário da visita: oito horas.
Trazer aqueles diários, experimentar
Idiomas. Reunir cavernas, rouxinóis, bisões,
visões bifrontes [Jano à espreita], forças nas
pernas pra escalar Kilimanjaro: A Montanha
Branca dos Masais.
[As intempéries podem ser cruéis].
Hora da visita. Mudas pelas portas
que fechas. Encontras outra palavra
à medida que, da velha, emudeces.
Não há mistério: só escolha.
Sonhos discorrem sobre as frestas
e escorrem sobre as folhas. Verdes
sonhos: descaminhos de Ítaca,
Assombros de Hades.
Alguém te ouve e pensa em Ilha.
Quem dera. Não vê quem te beijou
a face.
Alguém vai à farmácia para ver a
atendente. Ouve, na fila, uma frase
de Borges. São assim as filas: cheias
de lanças, tropéis, tropos e alquimias.
Alguém vai à farmácia e pega a fila,
sem spleen ou tédio, mas nada esplêndido.
Da Palha ao Azul, do Azul à Palha.
[Passiflora].
Alguém te ouve falar e se esquece
do sino, deixa de acreditar no silêncio e
no branco definitivo do marfim.
Divaga, chama por alguém e pede um
chá, abandona moedas sobre vasos de
plantas, recita os Vedas e Upanishads,
conta as cores das chamas nas manchas
solares, abre as mãos pra mostrar as
palmas.
Alguém te olha e pensa em Ilha,
cansado de jogar, ao cão, a toalha,
cansado de medir a extensão do atelier
de pintura,cansado de contar números na
borda do sono, as notas rasgadas; das cólicas,
cada fisgada.
Alguém te ouve e pensa em ilha.
Quem dera. Deixa ir a penhora,
a tradição histórica, o verde da
pupila, a cega sede sobre o
copo de urina.
Alguém te ouve e abandona
o sonho do traçado retilíneo.
Não da pra carregar tanta coisa.
O segredo de largar não se acumula.
Todas as pedras se aclaram. O peso maior
que o peso quebra a adaga em pequena
poça e afunda o vergalhão no plexo.
Não dá pra coligir tantas recusas.
Seja cada forma a última para, no
fim, deixar de ser qualquer uma.