sábado, março 29, 2008

Novas loas


Foto Dade Amorim.

Estrelas-guias do acaso
pousaram na janela.

Perdido o rumo
o pasto
o prumo de dois gumes
pessoais pronomes cantam
novas loas
tapumes bebem ruas
e o céu pendura sua lasca de lua.

sexta-feira, março 28, 2008

Fim de festa


Foto Andzerej Jurczak.

...

Olha, amor, tudo rachando
tudo a pique de ruir.

Olha que obra incompleta
abandonada, esquecida
olha o sonho carcomido
que esquecemos de sonhar.
Olha o filho que enjeitamos
o amor que não amamos
e os projetos sine die.

Olha as ilusões pisadas
quase tudo, quase nada
olha as tardes da colina
rolando de morro abaixo.
Olha o fogo distraído
se esquecendo de queimar
e os espinheiros que crescem
abafam
cobrem
florescem
suas flores desiguais
e esse cheiro de velório
que engole as damas-da-noite
e esse frio pela praia
os tapumes no caminho
a farpa entrando no pé.

A alegria trancada a sete chaves
numa gaveta qualquer
e nós perdemos as chaves
uma a uma.

terça-feira, março 25, 2008

Alento




Minhas palavras
o vento costurou a sua veste.

O trigo a uva e as rosas
invadem as campinas
e a frase menos límpida
ainda busca o alento da manhã.

Ouve as palavras do vento

Mais que de ausência
essas palavras rondam tua casa
com ânimo de sol

sexta-feira, março 21, 2008

Desolação

As dissonâncias do vento
desmantelaram a música
que a noite prometia.

segunda-feira, março 17, 2008

Data



Meia-lua
entrevista da janela.

Mais um naco de alegria
arrancado à força
em noite de quarta-feira
dia dezoito de outubro
num ano do século vinte.

domingo, março 16, 2008

Expedientes

Não há nada pior que a solidão
quando se sabe
que a carrocinha do sorvete está na esquina.

Fugir será talvez uma saída
antes que a réplica do amor se sobreponha
a nossas belas viagens de recreio.

Melhor que tudo
é o lastro que mantém a embarcação
à tona.

sexta-feira, março 14, 2008

Mira



Henri Matisse. Femme se reposant.



Dono de noites e tempestades
voa o desejo.

Todo desejo
é alma sempre nova
tem os cabelos molhados
o desapego aos ombros
mira imbatível.

terça-feira, março 11, 2008

Verão



A pele do verão
é flor madura.

O sol do estio viola
segredos e sementes
a olho nu.

sábado, março 08, 2008

Pipoca urbana

Pipoca urbana

O homem passou sem ver ninguém
absorto em pensamentos
de amor ou malquerença
talvez dor.

Seus pensamentos
bolhas de sabão
não iam longe
mas escorriam
pelas vitrines
postes
e invadiram a carrocinha de pipoca
em frente à escola.

Naquela tarde
os estudantes acharam diferente
o gosto da pipoca.

quarta-feira, março 05, 2008

A noite não tem cura



Mudam as luzes
luas de mecúrio
no bar escuro as faces desfocadas
e o tédio requintado
no piano.

A noite ilude os convivas
no tombadilho da aurora
em conversas transitórias.

A noite não vai ter cura.